terça-feira, outubro 06, 2009

Poema para o carnaval de Salvador

Antônio Frederico abandonara Ilhéus, sua cidade natal, para viver em Salvador e dedicar-se à faculdade.
Ilhéus se distinguia como uma cidade rica e seus moradores possuíam uma visão progressista, entre todos os municípios habitualmente pobres e atrasados do interior da Bahia.
A cidade era bela, com avenidas largas de jardins floridos e a maioria das casas pertencia a coronéis que as transformavam em verdadeiros palácios mobiliados com luxo e soberba.
Derico, apelidado desde a infância, estava envolvido demais com os estudos do Direito para se dar conta dos mistérios que Salvador lhe guardava.
O rapaz de vinte e quatro anos era fã de música e literatura e desde pequeno ouvia atento as história de sua mãe sobre a origem de seu nome, uma homenagem ao poeta Castro Alves.
Dentre todos os charmosos lugares de Salvador, Derico carregava uma paixão pela Praça Castro Alves, lugar que costumava frequentar todos os dias. Fica ali por horas e horas estudando, admirando a paisagem ou simplesmente acompanhando o passar das pessoas com o coração apertado de saudade de sua mãe e das histórias sobre o poeta que ele já não ouvia mais.
Ele aprendera que na época de carnaval, a praça verdadeiramente era do povo, mas Derico não se importava. Como uma espécie de batalha ciumenta, continuava a frequentar a praça e muitas vezes se colocava à frente da multidão, importando-se mais com a praça, do que com o carnaval.
Derico não se entusiasmava nem com um grupo de mulatas cor de canela que se requebravam voluptuosamente em sua frente com os seios quase à mostra.
- Eugênia, venha depressa, você vai acabar se perdendo!
Linda e deslumbrante. Estatura mediana, muito bem fornida de carnes, os ombros escondidos pela longa cabeleira dourada. Blusa branca de malha, simples e discreta, deixando marcar os seios intocados. Calça jeans colada, valorizando as coxas fartas. Que volumes! Os pés delicados e macios chegavam a pedir licença para pisar na praça.
Derico a olhara em uma fração de segundos, um tempo imenso, uma eternidade.
Lembrara das histórias de sua mãe e uma convicção de estar diante da mulher da sua vida o fez segurá-la.
Foram dançar e a dança que os juntava fazia-o desfalecer. Eugênia possuía um olhar penetrante, um charme misterioso. Beijou-a muito. Abraçou-a muito. E notou que todos se beijavam e se abraçavam muito. Era carnaval, época dos instintos, época de pele, carne e volúpia.
- Me encontre aqui amanhã ao final da tarde. Esperarei por você.
Ainda embevecido, Derico não conseguiu desvencilhar seu olhar de Eugênia, que aos poucos sumia, restando apenas a multidão a comemorar.
Todos os dias, como de costume, Derico volta à Praça Castro Alves. Agora, com a esperança de avistar sua Eugênia se aproximando. De onde ela virá? Das igrejas? Dos barcos no cais? Do mercado? Dos batuques do candomblé? Da multidão do carnaval?
Derico deveria saber que em se tratando de Salvador, ninguém jamais deve tentar decifrar os segredos da cidade. Seus mistérios e lendas são envolvidos pelo corpo, alma e coração dos baianos.

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