quinta-feira, setembro 18, 2014

Retas e Curvas

Quando foi, menina, que curvaste ao destino?
Tu, que sempre tão reto seguiu teus caminhos
Por que logo agora
O viés clandestino?

Apostaste no vazio, nenhum raciocínio
Por um triz não virou desatino
Numa dessas, arrancam-lhe do olhar o brilho
E aí, como faz?
Vais viver só com o tino?


Siga teu prumo, menina
Caminhe na linha, compasso de hino
E se uma esquina qualquer dobrar
Vade retro
Não te curves de novo ao destino



segunda-feira, setembro 01, 2014

Pra você, Kusch

Natália Kuschnaroff.
Lembro quando vi uma lista com os nomes de todas as pessoas da minha sala na faculdade antes das aulas começarem. O sobrenome dela me chamou a atenção logo de cara. Kuschnaroff. Imaginei uma menina loira, bem russian style. Dito e feito. Ela não era só loira, era a loira mais loira que já conheci na vida. Dona de um cabelo invejável, que lhe rendia muitas perguntas sobre tintas, quando na verdade a cor era natural.

Ficamos amigas logo no primeiro semestre. Apesar das diferenças gritantes entre nós (ela era judia, eu sou ateia, por exemplo), ela sempre surpreendia com comentários inteligentíssimos, linguajar próprio e um humor fora de série. A Kusch era mais madura do que o resto do pessoal, mesmo tendo a mesma faixa de idade. Sem contar o bom gosto musical, isso sempre me deu bons amigos.
Era uma pessoa com muitos dramas pessoais e acho que foi isso que fez com que a gente se identificasse tão depressa. Foi, sem dúvida, uma das minhas poucas amigas da faculdade.
 E fora dela também. Apesar de nos falarmos com menos frequência depois que saí de São Paulo, estávamos sempre em contato.

Na última quinta-feira a Kusch se foi.
Não sei bem ao certo como, mas ela foi atropelada voltando pra casa, depois de um dia normal de trabalho.
E agora estou eu aqui, com 33 anos me perguntando por que ela nem completou 30.
A tristeza é muita e faz pensar. Desde que recebi a notícia, não consigo parar de lembrar de todos os momentos que passamos juntas. 

Os papos sobre Foucault (ô simpáticô, bora discutir Foucault), Fernando Pessoa (continuo achando um porre), sobre os gatinhos da faculdade, sobre os gatinhos que a stalkeavam, sobre o pessoal do teatro, sobre a ESPM, sobre a criatividade, sobre a legalização da maconha, sobre a pizza só de catupiry e sobre “conhecer a fúndole a índole de cada umdole”.

Eu nunca vou me adaptar a essa característica efêmera da vida. Não mesmo.
Desde que minha vó morreu dormindo, eu pego no sono preocupada todas as noites. E minha preocupação se estende ao sono de todas as pessoas que eu amo. Tenho medo, muito medo, de mais alguma morrer dormindo.
E assim vai ser pra atravessar a rua daqui por diante. Pra sempre.

Talvez seja meu modo de tentar entender ou talvez seja a simples falta de uma rede social. Mas hoje passei o dia todo vendo nossas antigas fotos de 2004. Procurei seus registros no twitter, instagram, li seu blog antigo e reli o novo. E por coincidência, achei um post chamado Breve Ensaio Sobre Despedidas.

Nele você conclui o quanto tudo é efêmero. O quanto a vida se parece com um Ipê: robusto e formoso, cheio de vida e, pouco tempo depois, frio, seco, morto. 





Quer saber? Concordo com você: eu adoro o Ipê.
E toda vez que eu vir um amarelo, bem grandão e cheio de flor, eu vou me lembrar de você e da porra da efemeridade que a gente é refém.


Obrigada por fazer parte das aulas, da vida. 




Compartilho a cena que, na minha memória, pra sempre será você, somente você, dançando com o Tomás pelos corredores da faculdade.